Aves de rapina: As mulheres de Nigéria

A mais vitoriosa seleção africana em busca de um lugar ao sol no futebol feminino.

Igor Santana
7 min readJun 11, 2020
Foto: Divulgação

A seleção feminina de futebol da Nigéria é de longe a maior potência do futebol africano. O país conhecido pelo que fez nas Olimpíadas com a equipe masculina, tem tradição também no sexo oposto e as meninas de Nigéria buscam cravar sua bandeira no cenário mundial. Maior campeã do continente, o plantel apresenta novos talentos todos os anos e se aproximam cada vez mais de uma grande exibição.

As Super Falcons, como é conhecida a seleção feminina de futebol da Nigéria, é a equipe da África com mais participações em Copas do Mundo, tendo chegado a todas as edições do campeonato que é realizado em quadriênios no ano seguinte a competição masculina. Iniciado em 1991, as meninas estiveram também nas edições de 1995, 1999 (onde chegou as quartas de final), 2003, 2007, 2011, 2015 e 2019 (onde chegou as oitavas de final).

As nigerianas são também, disparadas, as maiores vencedoras da Copa Africana de Nações de Futebol Feminino, com 11 conquistas em 13 edições do torneio. Levantaram a taça em 1991, 1995, 1998, 2000, 2002, 2004, 2006, 2010, 2014, 2016 e 2018. Além delas, apenas a seleção da Guiné Equatorial já venceu o torneio por duas vezes (2008 e 2012), ambas as edições disputadas no país das vencedoras.

Nesse contexto, parece que a África ficou pequena para as meninas. A força do futebol nigeriano deve em pouco tempo alcançar seu ápice e muito disso se deve a suas grandes jogadoras. O prêmio de melhor jogadora africana do ano é dado desde 2001 (tendo sido deixado de lado apenas em 2009 e 2013). Desde lá, em 17 edições, 11 foram vencidas por nigerianas.

Asisat Oshoala (2014, 2016, 2017 e 2019)

Foto: Daniela Porcelli/Joerdeli Photography

Asisat Lamina Oshoala veio ao mundo 9 de outubro de 1994, nascida em Ikorodu, cidade ao nortesde de Lagos, capital do país. Atualmente é a principal estrela da seleção nigeriana, onde atua desde o ano de 2011. A atacante também é jogadora do Barcelona, da Espanha.

Ainda com 20 anos, Oshoala já carrega grande história pelas Super Eagles. Foi eleita artilheira e melhor jogadora do Mundial sub20 de 2014, participou de duas copas do mundo (2015 e 2019) e conta com dois títulos da Copa Africana de Nações (2016 e 2018).

Asisat recebeu em 2014 o título de Membro da Ordem da Nigéria, maior honraria do país, dada pelo próprio presidente. Ao lado de Perpetua Nkwochaf, Samuel Eto’o e Yayá Touré, acumula quatro conquistas como melhor futebolista do continente africano.

- Isso me faz continuar, mas é claro que ainda há mais trabalho a fazer, quero criar minha própria história e não apenas igualar o recorde de outra pessoa. Darei o meu melhor para criar o meu— afirmou em entrevista à BBC.

Oshoala ganhou das companheiras o apelido de Seedorf, em homenagem ao jogador holandês homônimo.

Perpetua Nkwochaf (2004, 2005, 2010 e 2011)

Foto: GettyImages

Perpetua Ijeoma Nkwocha nasceu em 3 de janeiro de 1976 em Lagos, capital da Nigéria. Serviu a seleção nigeriana de 1999 até 2015 atuando como meio campista. Atualmente a ex-jogadora é técnica da equipe feminina de futebol do Clemensnäs IF, dá segundo divisão do campeonato sueco.

Perpetua participou de quatro Copas do Mundo (2003, 2007, 2011 e 2015), de três Olimpíadas (2000, 2004 e 2008) e das campanhas vitoriosas da equipe nas Copas Africana de Nações de 2002, 2004, 2006, 2010 e 2014. Até hoje é a maior artilheira das Super Falcons, com 80 gols em 99 jogos (média de 0,8 bolas na rede por partida). A jogadora ainda é autora do gol que sacramentou a vitória por 1 a 0 sobre o Canadá, potência mundial do futebol feminino, na Copa do Mundo de 2011.

- Quando fomos à Copa do mundo, sentimos que tínhamos que evitar perder por 6 a 0 ou algo assim. Tivemos pequenos prazeres em sermos competitivos. Com o tempo, estamos aprendendo e subindo. Agora, temos muitas jogadoras no exterior e podemos trazer essa experiência — afirmou em entrevista ao site FIFA.com

Nkwocha é recordista do prêmio de melhor futebolista africano, junto a Asisat Oshoala, Samuel Eto’o e Yaya Touré. Todos com quatro conquistas.

- Qualquer um que represente seu país sente que está representando toda a África, e eu era o mesmo. O futebol africano está crescendo agora e estamos aprendendo muito. Um dia, a África governará o mundo e vencerá a Copa do Mundo ou as Olimpíadas — afirmou durante entrevista ao FIFA.com

Cynthia Uwak (2006, 2007)

Foto: Autor Desconhecido

Cynthia Uwak nasceu em 15 de julho de 1986, em Akwa Ibom, no litoral sudeste do país. Serviu a seleção nigeriana de 2002 a 2010 como atacante e seu último clube foi o Aland United, da Finlândia, onde atuou até 2016. Desde então a jogadora não esteve em outra equipe, porém ainda não anunciou aposentadoria.

O currículo de Cynthia conta com a participação nas Olimpíadas de 2008 e na Copa do Mundo de 2007. A jogadora ficou de fora do elenco de 2011 após uma lesão no ano anterior e desde então não retornou para partidas importantes da seleção. Em 2016, quando chamada para ingressar o selecionado para a Copa Africana de Nações, competição que já ganhou em 2004 e 2006, negou-se a retornar as Super Eagles.

Uwak é uma grande defensora da liberdade sexual para as mulheres e até pouco tempo era muito ativa nas redes sociais, principalmente no Instagram. Por diversas vezes a atleta se colocou contra os pensamentos machistas de que jogadoras de futebol são lésbicas.

- Dizer que jogadoras de futebol são lésbicas é bastante patético. Você não pode simplesmente rotular as pessoas com base em suposições — declarou durante debates na Nigéria.

Em 2016 a atacante sobreviveu a um acidente de carro ao capotar com seu SUV. Em postagem no Instagram a jogadora agradeceu a Deus o livramento e ressaltou que não teve nenhum arranhão.

Mercy Akide (2001)

Foto: GettyImage

Mercy Akide Udoh chegou ao mundo em 26 de agosto de 1975, em Port Harcourt, cidade do estado de Rivers, na Nigéria. A ex-meio campista atualmente é mãe de duas meninas e trabalha como treinadora em universidades dos Estados Unidos, além de comandar o projeto Play2Learn, projeto realizado em seu país natal para meninas que sonham em jogar futebol.

A história de Cynthia conta com três participações em Copas do Mundo pelas Super Eagles (1995, 1999 e 2003), duas Olimpíadas (2000 e 2004), três títulos da Copa Africana de Nações (1998, 2000 e 2002) e o primeiro prêmio de futebolista africano do ano distribuído para mulheres. Também foi a primeira jogadora africana a figurar no time ideal da Fifa.

Mercy já afirmou em entrevista à BBC que, se a federação de futebol do país (NFF) não mudasse, suas filhas jamais jogariam pelas Super Eagles.

- Sinto muito, minhas filhas são americanas, com essa situação acontecendo, se algo não mudar, não jogarão pela Nigéria. Quem quer sofrer? Fizemos isso em nosso próprio tempo, esta é uma nova geração, elas não deveriam estar sofrendo o que sofremos — comentou a ex-jogadora

Segundo ela, as atletas do país são deixadas de lado pela NFF e os subsídios prometidos para as meninas caso vencessem a Copa Africana de Nações de 2016 não foram pagos.

- Elas lutaram com tudo, então deveria ter sido um final feliz. Essas crianças têm famílias, seus pais estão esperando que voltem e ponham comida na mesa — concluiu.

Foto: Jean-Pierre Clatot / AFP

Dentro de um continente tão cheio de vida encontra-se na Nigéria uma potência nos gramados africanos. As fragilidades do futebol feminino não são uma novidade para ninguém. Mais do que lhe dar com descaso ou a falta de renda, elas precisam lhe dar com o preconceito e, vestidas de verde e branco as Super Falcons mostram que estão a frente de qualquer coirmã e bem próximas do patamar de potência mundial.

Hoje, as africanas começam a ser mais reconhecidas no cenário mundial pelo que fazem com a bola no pé. Enquanto Akide, Uwak e Nkwochaf asfaltaram o caminho, cabe a Oshoala e tantas outras meninas de Nigéria construir o legado do país. Quando a visibilidade e o devido incentivo forem entregues a quem tem talento, tudo será mais fácil.

--

--

Igor Santana
Igor Santana

Written by Igor Santana

Jornalista, assessor da Ouvidoria da Defensoria Pública do Rio de Janeiro e programador de jogos digitais nas horas vagas. @santanaigor27

No responses yet